Debruçado sobre a mesa,
Sem reações físicas,
Meus olhos vermelhos ardiam,
O hálito exalava podridão.
Entornei um gole de cachaça,
Cuspi catarro ensacado.
Acendi o cigarro paraguaio,
A nicotina rasgou a garganta.
Minha existência tenebrosa,
Amores inacabados,
Tudo definhando
Num revés inumano e infindo.
Corri o olho no boteco,
Lugar deprimente
Com homens decadentes
E mulheres horríveis
Aquilo não me aclarava,
Mas eu não conseguia fugir
Do ambiente dos fracassados,
No fundo, era uma necessidade.
Trôpego, cambaleei sem rumo.
Ingeri dezenas de anfetaminas,
Fumei um tufo de cannabis
E acabei aspirando crack.
Vi um dragão em chamas,
Vampiro desdentado,
Jesus Cristo genérico,
E pastor vendendo salvação.
A sensação de alegria
Foi bruscamente interrompida
Pela excessiva depressão
Associada a alegria do suicídio.
Não conseguia raciocinar,
Minha cabeça implodia,
Fraqueza muscular atordoante.
Nada mais era como antes.
Outro cigarro torto no dedo,
Uísque falsificado combinado
Com pimenta Carolina Reaper
Findou numa convulsão.
Senti uma fraqueza intensa,
Como um soco no coração.
Meus batimentos inaudíveis,
A visão desfocada, um breu.
Dor semelhante a fórceps,
Feito carnegao implodindo,
Tal qual mordida de pitbull
Acometido por raiva incurável
Acordei ainda sonolento,
Não recordava de nada.
Os nacos de carnes azuis
Ainda grudadas no corpo.
Tossi, arroxeado,
Vi pedaços do pulmão
Explodirem no ar,
Nacos verdes em putrefação.
Estava arruinando o caos,
Tripudiando com o destino
Que acabara de ser modificado,
Vencido por alucinaçoes.
Respiração ofegante,
Tateei a face, estava entubado.
Meu corpo estava gelado.
A calota polar descontrolada.
Eu falava sem abrir a boca
Ninguém me ouvia.
Tentava me mover
Mas não saia do lugar.
Estava encafifado, tremulo.
Homens com aventais brancos
Me encaravam e anotavam.
Fui colocado num armário.
Gritei protestando,
Eu estava vivo, apenas imóvel.
Um médico calvo disse:
Autópsia concluída
Hermético, fiquei paralisado.
Me colocaram num caixão.
A terra invadiu a cova, e me
Tornei número de estatística.
Após 58 horas agonizando,
Vi-me desfazendo,
Consumido por bactérias
Que viviam em minhas vísceras.
"ESCREVO O QUE SINTO, MAS NÃO VIVO O QUE ESCREVO"
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